sexta-feira, 4 de julho de 2014

O desenho, um amigo mentiroso e a navegação

Se ponho no papel três rabiscos mal feitos, dependerá se é uma casa feita por criança do maternal ou a reprodução fiel do trabalho de Michelangelo na Capela Sistina. Quem dirá é o julgador. Um bom amigo escolherá a segunda opção.


Um amigo é sempre sincero; não nego. Mas a verdade que interessa é a intenção. Se ele disser que meu desenho é ruim, nunca mais desenharei. Mas se diz que é bom, mesmo não sendo, continuarei; um dia será. A verdade de um amigo é o suporte que ele dá; sobre a necessidade de seguir em frente.

Disseram: “Navegar é preciso. Viver não é preciso”. Viver é aventurar-se, quebrando a cara, sem que se saiba descrever o que é a exatidão de uma conduta. Porque a vida não oferece fórmulas; viver é vivendo. O amigo sabe disso e diz: seu desenho é bom, e melhorará!


Se o mundo não admite descrição exata, ele é mesmo uma mentira por definição. O trabalho do amigo é apresentar só outra versão: navegue; navegar sempre é bom, porque é teu o mar. Três rabiscos sem talento, se teimosos, fazem terra de altos coqueiros. Diante de um desenho ruim, o amigo diz: bonito, porque aperfeiçoará!


O amigo mente tipicamente: é uma mentira com vencimento, porque ela amadurece e um dia é verdade. Se o desenho é ruim, nem sei eu, nem sabe ele. Mas ele, conhecendo minha vontade, fica perto de desenhar por mim, quando mente: é obra de arte!


É por isso que a dedicatória deveria chamar-se título: quem faz, finalmente, o bom desenho, não é a mão do desenhista, mas do amigo que ditou as normas: continuar, continuar, continuar!

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