segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

O Doutor do Plantão



(Jacob Aue Sobol)

Um colega me disse que iria fazer medicina, porque o plantão paga bem. Esse é o tipo de pessoa que corre para fazer a matrícula em uma faculdade particular, guardadas as exceções. Sem fiscalização, qualquer vagabundo passa no vestibular. Está acontecendo com o curso de medicina o que aconteceu com o de Direito: mais faculdades que lanchonetes e farmácias na cidade. A angústia dos pacientes não tem emocionado muitos dos nossos anjos da ciência. 

Tenho medo dessa situação. Daqui a alguns anos, eu precisarei de cuidados médicos. Meus filhos precisarão. E quem cuidará de nós? Alguém preocupado com o quanto ganhará no plantão. Esse tipo de gente não está interessado em curar, mas em engordar os bolsos no final do mês.

Aliás, não é um problema exclusivo do futuro. Há alguns dias conversei com uma médica e ela narrou a situação dos hospitais de Recife. Entre os médicos há um acordo: se um familiar adoecer, ligue pra um médico amigo, pra saber quem está na UTI de determinada unidade. Ligue pra consultar qual é o hospital confiável, naquele momento, para levar um enfermo. E quem não tem esse conhecimento? Leva a qualquer lugar e fica à mercê de um “doutor de pontos”. 

Hoje de manhã eu dei continuidade à leitura da obra de Bauman. Em um de seus livros ele disse algo que me acalmou. Não porque me apresentou uma solução. Mas porque mostrou que minhas conclusões não são absurdas. As pessoas estão preocupadas com a administração do individualismo e se afastam das reflexões morais. 

Médicos preocupados com suas férias em Dubai. Juízes preocupados com o financiamento do seu utilitário esportivo. Engenheiros apreensivos com os juros do empréstimo imobiliário. Os profissionais estão preocupados em “bater o ponto”. É como um administrador do holocausto. De manhã, tortura. À noite, conta histórias de amor aos filhos. 

Eu respondi ao meu colega que ele não deve ter o dinheiro como principal motivação pra escolha de uma profissão. Claro que não fui ouvido. Hoje em dia esse conselho é uma instrução aos ventos. Passa por todos os lugares, mas não aterrissa no senso de moralidade.  

Um comentário:

Anônimo disse...

infelizmente é verdade, em grande medida...

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